quarta-feira, 4 de junho de 2008

Mouraria



Anos trinta, quase há oitenta anos. Mouraria. Rua João do Outeiro.
Zona de fadistas, marialvas e rufias, que em Lisboa, tal como a do Castelo e da Madragoa recebiam todos aqueles que debandavam das suas aldeias à procura de novas vidas.
Colmeal, Carvalhal, Rossaio, Soito, Ceiroquinho, Luadas, Benfeita, Fajão, Cavaleiros e tantas outras aldeias dos três concelhos mais carenciados, aqui depositavam os seus filhos em casas pequenas onde sempre cabia mais um. Generosidade e solidariedade beirãs nunca fechavam uma porta, nunca negavam uma sopa ou um pedaço de pão.
Capelão, Escolas Gerais, Marquês de Ponte de Lima, Coleginho, Benformoso, Terreirinho, Guia, Santo André, Olarias, albergavam famílias provenientes dos concelhos pobres de Arganil, Góis e Pampilhosa da Serra. Naqueles tempos em que as carências no acolhimento eram múltiplas mas um luxo quando comparadas com as que havia nas origens.
Hoje a Mouraria, que um dia os mouros deixaram para os nossos conterrâneos, está diferente, maltratada, desfigurada. Nos tempos de agora é possível fazer uma rápida viagem pelo mundo passando pela Mouraria, considerado hoje o espaço mais multicultural e multirracial da cidade de Lisboa.
Espaço que é frequentado e partilhado por paquistaneses, indianos, cabo-verdianos, guineenses, moçambicanos, chineses, nepaleses e naturalmente por portugueses que, cada vez mais , vão sendo cada vez menos. Falam-se outras línguas, discutem-se outros problemas. Quase não se fala de regionalismo.
Na fotografia tirada na Rua João do Outeiro, toda ela "povoada" de conterrâneos, podemos reconhecer António Domingos Neves, um dos fundadores da União Progressiva da Freguesia do Colmeal, assinalado á direita com uma cruz. Junto de dois amigos e conterrâneos, apenas sabemos que o miudito de boné, por detrás da cancela da porta, é o Mário Domingos, hoje a residir no Cadafaz.
Numa pintura a café segundo a técnica da aguarela, recordamos aos mais antigos, o Arco do Marquês de Alegrete, deitado abaixo aquando da introdução do Metropolitano em Lisboa, pelos anos sessenta do século passado. A secular capelinha da Senhora da Saúde mantém-se como um ex-líbris deste típico bairro de Lisboa.

A. Domingos Santos

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